terça-feira, 21 de agosto de 2012

46 - ALEATÓRIAS HISTÓRIAS - O ESCRITOR QUE POUCO ESCREVE

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"Quanto um escritor escreve por dia? Como ele mede isto? Em páginas de computador? Deve ser, porque não acredito que haja algum que escreva à mão, muito menos nas máquinas de escrever... Impossível. Ele mede em horas, em dias trabalhando?".

Refaz a pergunta todo dia durante o trabalho e em casa. Fosse, creia-se, pela obrigação que pensa ter em escrever sem parar por horas a fio para poder se intitular "escritor" como ele supõe que deva ser.
As tentativas seguidas por anos resultaram no hoje e em sua verdade: trabalha em uma editora, maior da América Latina , com o cargo de diretor de publicação; foi promovido dois anos atrás de revisor-chefe que fora por quase seis anos.
E porque a cobrança tamanha?
Depois que ascendeu no organograma da empresa, houve uma certa inconstância no ato de escrever e parece mesmo que o tesão em fazê-lo não se faz como era dantes. 

"Mas qual tesão? Primeiro eu tive aquele fase de participar de concursos literários no Brasil todo e até mesmo em países de língua portuguesa; em um deles quase fui para Angola junto com a obra. Contos, poemas, crônica, qualquer um porque minha preocupação - 'sanha' né? - era participar de todos, era que pessoas acadêmicas lessem, que eles, os escritores, só de lerem o que eu fiz tornava-me um membro deles... Eu não fazia distinção de gênero, nossa! Participei de vários. Ficava atento fuçando na internet e descobria um atrás do outro. Lembro bem que o de 1998 foi o que deu início a tudo. É, eu pensei que fazendo assim seria reconhecido como escritor profissional. Pensei que pudesse ganhar minha vida assim, viajando na tela do computador para fora do castelo."

Predileção afetiva pelo conto: havia escrito dezenas deles, talvez mais de 50. Identificava-se mais com histórias que não se prolongassem mas que não fossem 'rapidamente finalizadas'. Escrevera cinco romances, um deles inacabado. As poesias convertiam-se em versos sem rimas. Mas inquietou e logo escrevia várias delas rimadas. Catalogou entre as que não foram limadas, mais 100. Por fim, as crônicas: não as apreciava e pouco fez deste estilo no sentido numérico.

Teve um dos concursos, para citar, que ele foi um dos 10 finalistas, com cerimônia e pompa, com gente vestida a rigor, tudo muito elegante, orquestra, teatro municipal de São Paulo, prêmios... Que ele não ganhou. Na última peneirada, seu conto de 30 páginas não ficou entre os 5 que concorreriam a um curso sobre literatura lusófona no instituto Camões, em Lisboa. Este aconteceu 11 anos atrás. E foi o próprio que o desmantelou por um tempo que nunca sabe precisar até hoje, porque parece que entrou em uma inércia em reler apenas o que tinha escrito até então.

Segundo, teve a fase iniciada depois do gelo/degelo de escrever e começou a produzir em moto-contínuo, pode-se afirmar, quando descobriu que podia ter um blogue. Produção virtual, rápida - sem ser rasteira -, na qual ele podia fazer encadeamentos quando assim desejasse, mas também escrever como se escrevesse para um seriado de tv (gostava dos americanos, sabia o nome dos escritores e roteirista de todos): uma postagem - começo, meio e fim. Às vezes, permitia-se em deixar um gancho para a próxima; em outras tudo se findava em uma postagem tão-somente.
Houve noites no quarto de estudo, ainda na época que só conselheiro-real habitava a cidadela junto a ele, que passava em claro postando sem parar. Nas noite frias e solitárias - geograficamente - não havia frio nem solidão quando escrevia, escrevia, escrevia sem parar, esquecendo de todo o resto; ida ao banheiro por exemplo, só quando terminava, muitas vezes de manhã, perto da hora de acordar para ir trabalhar.

Hoje tudo está muito diferente. O trabalho lhe consome toda a energia física e mental que possui e em razão desta conjugação, ele consegue ter uma vida financeira bem superior àquela anterior de quase não ter $ para quase tudo. Sobre uma eventual comparação, quando chega em casa - porque na editora tempo para divagações é escasso - entre as duas fases, ele se encanta ao fechar a porta e em ver o Felino e Rex ajuntaram-se a ele para lhe dar boas-vindas e mostrar a saudade diuturna que sentem. O castelo está completo sem as noites de escrever.

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