segunda-feira, 30 de dezembro de 2019

VIAGEM CCCLI - AO REDOR E MAIS LONGE

por onde anda? ao redor? mais ao longe?
ou aqui perto? onde você está que não chega
que não vem...
quando você vai chegar?

de onde? Em São Paulo procurei,
pela metrópole olhei, em um drone sobrevoei, nada vi.
Não está mais em SP?
Desceu ao sul?

Na gelada península da Antártida de mar azul?
Em alguma ilha perto da costa?
Mais adentro do continente, o mais sortudo dentre deles...? (porque não há dentro nem gente decomposta )

voou pelo Pacífico e chegou ao Taiti?
sol tórrido e você nadando em mares calmos em Fiji?
voando até Nova Zelândia admirou-se a ver a ave quiuí
e depois passeando por Sidnei assistindo uma efêmera opereta,

subiu para Tóquio em sua modernidade de século XXI,
Seul, Xangai, Bangcoc, ou passeou 
por uma nau em Macau falando português, talvez...
em Lhasa, no planalto do Tibete mandou-nos boas vibrações para o mês.

Deslocou-se a Beirute, na franja do Mediterrâneo,
pegou um avião e andou por Istambul, um pé em cada: Ásia/Europa.
mas pelo que sei de você, rumou para Atenas,
Creta, Míconos, Rodes e o Monte Olimpo falar com Zeus.

pegou um trem e passou por Bucareste, 
foi sob neve até a Transilvânia visitar o conde empalador...
de lá, seguiu para os canais de Veneza,
Avistou e visitou Roma, a mais bela como diz, e comeu pizza em Nápoles

em um dia de frio e sol, tomou café na Porta do Sol,
andando pelas ruas de Madri, museu e cinema
Andou de bonde pelas ruas de Lisboa,
leu Fernando Pessoa animado no Chiado...

Paris, Berlim, Copenhague e Estocolmo
em dias alegres com amigos indicando os melhores passeios
em Dublin um legítimo café irlandês esquentou os ossos
e fez aumentar a saudade dos corpos, de mil anseios...

Pelo nosso oceano, o Atlântico, foi a Montreal
em um país dos mais civilizados, 
em Nova Iorque exercitou-se no parque
e viu ruínas astecas perto da Cidade do México

Desceu até Belém do Pará
comprando compotas e especiarias amazônicas
na viagem pelo Cerrado retorquiu-se com as árvores retorcidas
entre Brasília e Goiânia

Com tanta saudade, passou rapidamente
em Piracicaba e visitou parentes e amigos
com mais saudade, bateu em minha porta às 2h30
um toque, dois toques, três toques

atendi sonado na tépida noite de São Paulo
e você falando, contando, teatralizando 
em detalhes mil com o sorriso ímpar
fazendo par com meu coração

Na Pauliceia voltamos a dormir juntos
esparramados e nus
lá fora todo o infinito mundo que não vale nada sem você,
só porque nos amamos.

quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

VIAGEM CCCL - CALHAS E ESPELHOS

Arquivo pessoal - Piracicaba/SP
eles: sem falhas no aparelho de amar
batem 2, batem um ao outro e recostados...
eles se pilham em eletricidade pelo outro

o leite talha, azeda, esquecido à mesa
o namorado ralha,  com o esquecimento, 
mas se tolhe quando o outro se desculpa

se rasgam as malhas, vestes únicas, se molham
então, o brilhar daquela manhã se acerta
na trilha de amar...

todas as tralhas assolhadas ficarão,
ajoelhadas para amealhar atenção...
ele gargalha e farfalha pela respiração

e, então, ofega...
para a batalha ele se debulha
em lágrimas que se empalham
de engasgar, secas pela barba...

entulhos? aqueles separados para o lixo;
fagulhas? somente centelhas de frenesis;
mobilhas? só os de madeira maciça, resistentes;
humilha você a quem lhe ama?

retalhos se espalham em mim, em você;
molhados de amor um ao outro
agasalhos são falhos em corpos desnudos...
porque o mergulho em nós nos cala...

o amor se espelha, 
se espalha 
em calhas retas e duras...

quarta-feira, 27 de novembro de 2019

VIAGEM CCCXLIX - O VENTO E A CALMA

Arquivo pessoal
"Vento uivando 

pelas frestas das janelas 

e portas fazendo uma alcateia de sons,

cercando-me por todos os lados:

uma tempestade vem vindo com nuvens

carregadas, plúmbeas e densas.

"Uma chuva de vento!", eu disse aliviado.

Fecham-se os leves vidros 

e batem seguidas vezes todas as pesadas portas.

Cortinas balançando em desvario; 

papéis flanando pelo espaço.

Fumaça subindo pelo ar na vertical.

Quadros dependurados se debatem

temendo a  gravidade da queda.

O ar úmido e frio envolve e me abraça: ventos

e mais ventos... 

Dia de ventania, 

prenuncio de calmaria na minha alma".

quinta-feira, 8 de agosto de 2019

VIAGEM CCCXLVIII - NA CONTRAMÃO

Arquivo pessoal - Largo São Francisco, São Paulo

"de leve que é na contramão".
(Lulu Santos, verso de)

pelas ruas, avenidas, ruelas, travessas, autopistas e marginais
eu observo e babo, boquiaberto

ver você andar, remexendo que só os quadris, com um gingado para se perder se encontrar o caminho

pela contramão da vida,
pela contramão do status quo
contradizer o discurso dos caretas

este discurso sem piedade
sem arte, sem amor
sem sexo e sem você - não!

só me faz olhar mais
e procurar por um guardanapo para me recompor 
da baba sobre minha barba hirsuta a escorrer 

e você anda, e vai, e vem, e rebola, e remexe
e mexe com meu juízo tão sério
tão profissional que acaba por solapar toda a minha seriedade

você me arrasta pela contramão
para que a gente se encontre,
para que a gente transgrida

e perverta a seta de mão única
nada disto, nada desta gente rança! 
minha seta é só para você, só seguirmos em frente.

quinta-feira, 1 de agosto de 2019

VIAGEM CCCXLVII - O CAMPEÃO MAIS TRISTE

Arquivo pessoal - Piracicaba/SP
uma medalha de ouro no peito, nada novo
para quê tudo isto?

mas e dentro do coração: latão?
brilhante, vistosa, ganhadora: 

esta é a tal medalha,
exposta, pesada e valiosa...

ganhou como?
na corrida pela vida, pelo dinheiro, 

pela saúde e pela paz,
pelas amizades

(foi campeão com rodadas de antecedência no campeonato das décadas).

pelos amores sequer conseguiu classificar-se
entre os medianamente amorosos:

desclassificado em letras grandes e timbradas pela escola de uma vida
vivida sem ouros.

ele não sabia como ter o ouro dentro do coração,
até agora havia sido o medalhista campeão sagrado mais triste

mais triste ainda, depois de tanto agosto seguido,
porque nunca fora primeiro no coração de ninguém,

e o que era pior: nunca permitira que acontecesse 
este campeonato no qual jogam apenas dois

sem o terceiro, o juiz, sem a torcida,
somente dois, que lutariam por mais amor

mais compreensão
mais tesão

mais respeito
pois nunca perderiam - os dois ganhariam com o tal jogo

então, o campeão mais triste abandonaria o pódio solitário
de campeão absoluto

e desceria ao chão para ser feliz ao lado de alguém
sem que lhes importassem quem chegaria em primeiro lugar

terça-feira, 23 de julho de 2019

VIAGEM CCCXLVI - DANADOS DE AMOR

Arq. pessoal - Piracicaba/SP
danos colaterais
colados

dúvidas e dívidas
que não sanamos 

e que não nos pagamos

a dor dilapidando demais
desde daquela vez

e que dominou nossa relação

dor demais!
dor demais!

delegamos à raiva a nossa conduta

nunca dantes havíamos feito disso
a regência de nossas vidas

o tempo passou
saudade sentimos

em calor ardemos solitários
duradouro, percebemos, é nosso amor

apesar das dúvidas
das dívidas
das dores

porque é bálsamo benigno
ouvir nossas bocas dizerem belezas, carinhos e afetos

porque é frenesi em seguida
beijos pelo corpo

em protuberâncias e reentrâncias...

danados de amor somos um pelo outro
o outro por um!


quinta-feira, 18 de julho de 2019

80] CENÁRIO SP - TODO ENROLADO

Arq. pessoal - Vila Mariana/São Paulo
"eu aqui, enrolado em edredons pesados

sem roupa, de gorro meio remendado

enrolo-me em pensamentos no quarto grande

em um cheiro, rolo de amor que roça meu corpo

rouba a quietude
rouba de forma rota meu juízo

ao lado do criado-mudo
tudo enrolado

naquele papel vindo de Roma direto para São Paulo,
que só espera por nós

neste frio gélido de julho, a Pauliceia madruga com a garoa
cobrindo a vasta metrópole

o frio nem consegue roubar o tal calor
que sinto, que tenho, que quero em você

e eu insone, reto nas partes, rijo, enrolo-me ainda mais
e mais em você

que veio, viu e venceu as resistências
bem das esfarrapadas dadas por mim

quando você me disse
que era um ladrão, um ladrão que não rouba $, bens ou casa

"Roubo você", explicando em um pausado, mas sôfrego
e alterado em cada sílaba

ah, e eu enrolando
em cima

embaixo
pelos lados

pela fresta da janela, São Paulo me roubou o sono,
o vidro embaçado rouba uma visão do céu...

só não me roube você de mim
(porque estou sozinho, com saudade do calor que um roubava do outro)".

domingo, 23 de junho de 2019

VIAGEM CCCXLV - TODOS TENTAM TUDO

Arquivo pessoal - Pátio do Colégio/Sé, São Paulo
todos
tentam
tudo 
teimando
temerariamente;

todos
tremem
tanto 
tropeçando em
tramas;

todos
tentam
transas
trancadas e
toscas;

todos 
tentam
traumatizando e
tutelando
tradições;

todos tentam
tutores, tiras
técnicos, tradutores
telefonistas, tintureiros e
todos tateiam tentativas;

todos
tiritam
tristes
tipificando as
tolerâncias;

todos tentam tudo nas
tempestades nos
turbilhões nas
tramas trançadas e 
tolhidas tantas vezes;

todos
tentam tudo até as 
tampas e 
transbordam para então
titubearem;

todos 
tranquilos
transcorridos os
tempos de 
trajar tolices;

todos tentam 
tremular no 
tabuleiro da vida o
tônus tinto de tecnologia;

todos tentam tudo até
as tralhas e trastes...
poucos tentam a correção.

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019

VIAGEM CCCXLIV - UMA DOSE DE QUÊ?

Arquivo pessoal - Bela Vista, SP
Entrar ou não entrar no moderno bar recém aberto perto de sua casa, ali, colado à Praça 14 Bis? Véspera de feriadão, expediente já acabou e um tempo livre para esperar o par. 

Gente descolada, maurícios, patrícias, hispters, artistas engomados, neo-alguma coisa, ou seja, parte da modernidade paulistana concentrada naquele bar que tem dois pisos. Mais o térreo, é claro. Ou, como se diz em Portugal, dois pisos mais o rés-do-chão. 

Rum?
Gim?
Cachaça artesanal?
E a dor de cabeça, amanhã cedo? Deve ser feita lá em Piracicaba, terra do amor que ele tem e que espera para logo mais.

Cerveja?
Chopp?
Vodca?
Vai exalar a bebida russa pelos poros, logo pela manhã... Mesmo que seja uma legítima moscovita para beber no inverno paulistano (que deve ser um outono por lá, ele supõe).

Uísque?
Campari?
Vermute?
Do escocês ele gosta. Até um kilt ele tem; comprado em algum lugar perdido das Terras Altas. 

Caipirinha?
Caipirosca?
Martíni?
Doce, doce demais. Parece que amarra a boca. Será que veio do Caribe?

Champanhe?
Frisante?
Vinho?
Dá muita sede, mesmo sendo um autêntico do Porto.

Entra ou não entra? O chão quadriculado de preto e branco lhe lembra Congonhas, causando até mesmo uma empatia com o lugar. Mas as pessoas.... Em um olhar com mais acuidade lhe desperta uma certa antipatia. Gratuita.

Cigarro na mão; última tragada. Vira-se para jogar a bituca apagada no lixo e vê outro bar, dois imóveis depois do 'modernex' bar. Já gostou de imediato. Antigo, decoração retrô e gente normal, de todas as vertentes. A Babilônia com algum jardim suspenso na sacada do 2º piso. E tem mesmo!

---- Um uísque, do escocês mesmo. Naquele copo pequeno, sem gelo.

Tomou algumas várias doses esperando uma espera disfarçadamente paciente e, quando para ir embora, quem chega? 

---- Trouxe aquele corote de pinga lá de Pira. Aquele que você tomou no vizinho do meu padrinho. Levinha, levinha. Nem dá ressaca nem nada.

Cambaleante, trôpego, fazer o quatro nem pensar, o bafão de uísque, é abraçado e escorado até chegar à entrada do prédio onde mora.

---- Uma dose de quê vai ser?
---- De você mesmo. Quero tudo.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2019

79] CENÁRIO SP - O CÃO, GOTAS QUE ESCORREM E A MENSAGEM

Arquivo pessoal - Piracicaba/SP
Logo pela manha cedo, ele acorda seu tutor, feliz e lépido. Preguicento que só vendo, ele lhe dá uns afagos e tapinhas na cabeça e diz bom dia no quase mais alto apartamento, prédio perto do icônico COPAN. Arfadas e ganidos fazem parte da arte do convencimento. Tem também a cara de cachorro sem dono: sempre funciona.  

"Vamos", ele pensa caninamente, "vamos logo. Quero ver o nosso vizinho, e ele já deve estar na rua, em frente à padaria, comendo e eu ainda aqui... Tenho tanta coisa a cheirar, a ver e claro, preciso muito de um alívio pro chamado da mãe natureza. Vamos! Por que não se levanta?".

Ele se levanta, direto ao banheiro, olha pela frestinha de luz da janela deixada aberta à noite que chove sem parcimônia em São Paulo, a Terra da Garoa. Gotas caem em profusão escorrendo. Os trovões se fazem acompanhar, até mesmo os raios; e então, um deles, de maneira a ensurdecer qualquer vivente, faz a energia cair. Ambos, no espaçoso apartamento, levam um susto  fazendo a respiração para por um instante. Irrompeu ao banheiro após, pois ele também precisa atender àquele chamado citado supra. 

Uma mensagem no celular, logo às 6h50, de um sábado que, segundo a previsão deveria ser de sol pela manhã; a chuva viria à tarde. Imagina que vai chover em volume de verão o dia todo e em sem parar em volume de inverno. A corrida e a caminhada pelo Ibirapuera fora cancelada pelo novo amigo (com alguns benefícios) em razão da água caindo do céu. Sozinhos ou não, eles vão ao parque todo sábado, fazendo frio ou calor. Somente a chuva o faz deter.  

---- Bonitona do pai. Hoje não vai dar pra a gente sair. Nem pro parque, nem pro café. Tá vendo esta mensagem aqui, no celular do pai? Então, por causa da chuva, vamos ficar sem ver nossos amigos. Ele achou melhor não irmos. Ei! Pode parar de fazer esta cara de cachorro sem dono. Vem aqui, vem! Fofa do pai! Que pena, né? Amanhã eu prometo que levo você, viu lindona?

Ele a coloca na área de serviço, já com o gordo jornal em mãos. Ela entende tudo e o segue, como uma boa menina (e arteira) que é.

A chuva segue sem trégua e a energia ainda nada. Tomando o café no banco da cozinha, ele ainda absorto por ter acordado, segue pensando nos benefícios daquela amizade. Descalço, vestindo uma velha cueca tão somente, sorri ao pensar na nova amizade (sem mencionar os seguidos bocejos). A companheira inseparável de quatro parecendo entender a razão daquele sorriso, chega na cozinha observando-o. Que amor mais incomensurável um detinha pelo outro, desde três semanas de vida. Ela fica feliz em vê-lo feliz. Aninha-se no tapete ao lado dele, tão segura, mesmo que a chuva pela Pauliceia apertando sem medo e sem dó. 

Mais uma mensagem, ele vendo a chuva cair pela janela, o conforta. E o "beneficiário" convidado-os pra um almoço naquele restaurante vegano na Alameda Jaú. O estabelecimento, moderno como a cidade de São Paulo, tem um lugar para cachorros ficarem enquanto seus tutores se refestelam no festim de vegetais, grãos e todo o resto concernente. 

Ele está feliz. E cada gota que escorre com certo vagar pela janela o faz lembrar que está lhe fazendo bem ter esta paciência nesta nova amizade. os pingos vão escorrendo, devagar, devagar inundando a borda do grande vidro... Em uma atitude tão certeira que os desobriga ter pressa. 

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019

VIAGEM CCCXLIII - UM AVISO AQUI DA TERRA

Arquivo pessoal - Piracicaba e o Rio Piracicaba
Um aviso por escrito da natureza do planeta redondo aos homens que habitam os quatro cantos da Terra. 

"Bilhões não estão perto de quaisquer soluções. Problemas tamanhos, um amontoado que ocupa espaço desde o fundo abissal do Pacífico ao topo do Everest. 

Há muita gente por aqui, sem sequer um predador natural, sempre é dito por nós, os elementos naturais, provisoriamente indefesos.

Atenção ao advérbio de tempo. O tempo passa e vocês todos sabem disso.

Para aqueles que matam, esfolam, destroem, trucidam, arrasam e poluem - o nome disto é poder, a causa é o dinheiro - seres, rios, mares, florestas, campos, várzeas, montanhas, animais - de primatas e a todos eles. 
Derrubam e queimam árvores para lá e para cá, sempre a torto e a direito.

Exploram a terra, arrancam minerais das profundezas terrenas
das profundezas dos oceanos

Plásticos! Tartarugas, peixes e baleias morrem.

à sua soberba a nossa indignação

ao seu desprezo a nossa importância

à sua matança a nossa luta

à sua ação a minha reação

à sua indignidade a nossa indignidade da inocência

pueril? infantil?

não; apenas a indignidade de inocente de quem da verdade está repleto,
ao lado, iluminado-nos e ensombrecendo-os.

Canalhas sem fim.
Demagogos dissimulados.

Para terminar com tudo, vocês conseguiriam
Para eu terminar com tudo, contudo, eu serei primeiro...

A minha reação será sempre pior que a sua danosa ação".

segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

VIAGEM CCCXLII - REENTRÂNCIAS AO REDOR

Arq. Av. Lins de Vasconcelos/Aclimação, São Paulo
Sempre o professor - de literatura comparada - recebia vias impressas em papel já usado no verso poemas de amor e de ódio. 

Este era de amor; nunca, ou quase nunca, sabia quem escrevera porque o tal autor não assinava... 

"ele se embrenha pelos pelos, pelas reentrâncias
ele se mata em suspirar provocando tremeliques

ele agoniza em arfar umedecendo recônditas fendas
ele chega e festeja o prazer que proporciona

diante disto tudo, em um passado recente
ele sofre pela ausência (mesmo que apenas dias sejam) 
daquela vontade de querer estar por perto
ao redor...

ao redor para sentir o cheiro da pele
ao redor para ouvir o riso desabotoado (que lhe dá colorido novo toda santa vez)
ao redor para escutar histórias, preocupações, realizações
ao redor para ver o amor por aí... por dentro de casa, saindo do banho, vendo TV

no presente só mesmo a agonia da saudade 
desmedida
demeritória 
desproporcional

um descalabro de saudade até o fim de todos os tempos...

'e que tempo é este?' perguntou-lhe um alguém qualquer
(que por certo nunca experimentara ter um sorriso que enobrecesse a própria vida)
'o tempo sem estar junto, isto só traz demérito à nossa felicidade', ele respondeu,
o alguém então desejou tanto ter uma saudade assim.

domingo, 27 de janeiro de 2019

VIAGEM CCCXLI - O DIA DE IR EMBORA

Arq. pessoal - Av. São Luís, Centro/São Paulo
Em um destes registros feitos a torto e a direito, indo à esquerda e à direita, feito bêbado em ladeira abaixo, em um eterno ziguezague, ele escreveu algo assim e mandou para si mesmo e com cópia para quem se destinava:

"Tenho ido embora de tanta coisa. Tenho ido embora de você, desta casa, deste beijo; tenho ido embora de tudo.
Porém, eu sempre volto... E está errado algo aí.

Não, eu não tenho que ficar indo embora toda vez do desgosto no rosto, do desprazer no sexo, da mentira que você conta e pede desculpa depois. 

Um dia destes, eu vou embora para sempre.
Porque, neste dia, eu terei decidido o melhor, dentro da dor que corrói, para mim. 
Sim, porque é na dor que se tomam decisões mais acertadas; o amor mentiroso como o seu, engana e fede.

Mas também tenho ido embora das coisas da vida; bem, de algumas delas. Você não reina sozinho neste privilégio de eu dever ir embora (um dia eu vou e está chegando este tempo), porque os machucados da vida vivida hão de cicatrizar. 

Fui embora das tristezas do passado porque desamarrei as correntes que eu arrastava - iniciei o processo de paz com tudo aquilo que vivi, contudo isto é só o começo.

Fui embora de lugares alguns, tão queridos e apreciados por mim. Tive que ir, porque já faziam mal e não realizavam bem algum. Demorei e não volto mais por lá.

Fui embora do descaso, do desperdício, da tristeza que queriam imputar em mim.
Tornei-me melhor.
Só falta mesmo eu começar a andar sem olhar para trás.

Vai chegar o tal dia de ir-me e a festa será comemorada com muita alegria, porque das amarguras suas, eu quero a doçura deste novo homem que tenho feito tanta força para construir. Morarei na nova construção.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

78] CENÁRIO SP - 465 ANOS DA CIDADE DE SÃO PAULO


"NON DVCOR, DVCO"*
Arq. Pessoal - Ed. Altino Arantes, no Centro Velho
parabéns São Paulo, a Terra da Garoa, a Pauliceia Desvairada, a Sampa da São João com a Ipiranga, a Essepê. São Paulo não pode parar.


Parabéns à cidade alfa, à maior cidade do Brasil.
Parabéns à mais brasileira de todas e à mais cosmopolita de todas.


Parabéns aos que vão, aos que voltam, aos que constroem, aos que protegem. Para aqueles que fazem poesia, que trabalham à noite e de dia, que cuidam de pessoas e bichos.


Parabéns aos 12 milhões de habitantes paulistanos, paulistas interioranos (este que escreve é um) e caiçaras, brasileiros e estrangeiros que aqui vivem.

Para os números desvairadamente superlativos: os quase 700 bilhões do PIB, aos mais de 7 milhões de veículos, ao milhão de pedaços de pizzas vendidos diariamente; aos hotéis, restaurantes, boates e inferninhos que acolhem e que divertem às centenas, aos milhares juntos; Praça Roosevelt, Vila Madalena e Augusta.

Obrigado Adoniran, Rita Lee, Mutantes, irmãos concretos Campos. Ao Mario, ao Oswald, à Lygia Fagundes Telles; aos modernistas de 22. Obrigado Vanzolini pela cena de sangue num bar da Avenida São João.

Obrigado Parelheiros pela reserva indígena, pela onça-pintada; Pico do Jaraguá e Serra da Cantareira. O Ibira, a Oca e a cidade coalhada de obras de Niemeyer.

Interlagos onde o paulistano Senna despontou. Palmeiras da Pompeia, Corinthians de Itaquera, São Paulo do Morumbi.

Obrigado Avenida Paulista, Masp, Trianon, arquitetura e imponência de encher os olhos; centro financeiro, nervoso, onde passam desde engravatados e mulheres de tailleur, a skatistas e também minas de cabelos alegremente coloridos.

Sim, existe cor - muita cor - e dentro delas existe o cinza, o branco, o preto, o vermelho e o amarelo.
A maior Parada Gay do Mundo, que desce a Consolação que se dispersa na Praça da República.

Os edifícios Martinelli, Itália, COPAN, Altino Arantes/Santander, Mirante do Vale que parecem mesmo arranhar o céu desabotoado de inverno ao carregado de verão.

São Paulo do verão de suores e do inverno tremores.

Todos que moramos aqui vamos de metrô, carro, trem, ônibus, bicicletas e helicópteros em ritmo frenético. "Vam'bora", "vam'bora", olha a hora, "vam'bora"

Ao mercadão e suas delícias de sabores, cores, odores e texturas. O que seria do comércio brasileiro se a 25 de Março não fosse o que ela é?

O samba também é paulistano. O rock, o eletrônico, o rap e outras expressões musicais.
São Paulo, meu amor, minha cidade, meu lar; uma sinfonia de amor, pressa, gente e diversidade mis.

São 465 anos desde que Anchieta e Nóbrega fundaram o povoado, nos campos de Piratininga. São Paulo dos Bandeirantes, da Proclamação da República, do MMDC de 1932, do comício das Diretas Já na Sé.

A São Paulo do café, nosso ouro negro que fez a cidade deixar de ser vila para se tornar metrópole.

São Paulo se fez pelos paulistanos e paulistas de norte a sul, de leste a oeste. E se fez também por baianos, pernambucanos, mineiros, cearenses, paraenses, paranaenses, goianos, alagoanos, gaúchos, amazonenses. 

Tem gente do Líbano, da Coreia, de Angola, de Portugal, Argentina, Itália, China, Espanha, Japão, Alemanha, Nigéria e mais uma centena de nações.

Tudo é superlativo por aqui em Essepê: dos problemas às soluções.

São Paulo não é uma urbe ensimesmada no próprio umbigo, porque não há tempo para contemplações egoísticas: aqui se contempla tudo, do pouco ao muito, de dentro para fora e de fora para dentro. 

São Paulo não para à toa. São Paulo vai.

Mais ainda superlativo que tudo é o amor que verte, transborda, que sua e que existe pelas artérias, marginais, avenidas e travessas.

Parabéns à cidade de São Paulo - é tanto amor.