quarta-feira, 26 de outubro de 2011

20 - ALEATÓRIAS HISTÓRIAS - OS BICHOS DE UM CASTELO

No sossego chuvoso do feriado de quarta podia-se ouvir o silêncio pelo apartamento todo. Em pé, percorreu com os olhos perscrutadores de sempre os cantos vivos de toda a sua sala. Pontas da mesa de vidro, braços das cadeiras e os quadros poucos de um azul largo e límpido. Cortina de treliça balançava preguiçosamente. TV de plasma desligada.
Felino ronronava em uma das almofadas.
Chovia pesado; não de tempestade de vento, mas em pé sem desperdiçar nada ao transcorrer todo ocaminho que vinha do céu e molhava o chão.
Aquele era o seu castelo e não o de antes - o de pedras, antigo -, o de agora pouco quando levantara-se da cama; aquele castelo escocês que cheirava a mar, estando este a estalar as ondas nos rochedos de milênios. Sobre toda esta construção desconhecida por ele, notava-se que por ali não adentrava ninguém. Fechado, impunha uma seriedade cavalar.
"E pensar que os escoceses não são nada tropícais em seus costumes e mesmo assim ninguém vem visitar este castelo de pedras cinzas e limbosas".
Trancou-se. Passou todas chaves na porta. Andou à porta de serviço, trancou-a e no silêncio daquela tarde meio escura aquietou-se depois desta movimentação. 
Jogou-se ao chão da sala.
Permaneceu aberta, um fiapo dela, a porta que separava a sacada do restante e a janela corrediça.
Ninguém para fazer barulho em sua fortateza urbana. Sua cidadela resistiria até o fim de quando ele não sabia como. Nem como ele sabia.
"Ei bigodudo. Acordou é? Tá chegando o dia! Amanhã nós vamos ter um outro habitante aqui no castelo... Castelo? Eu disse isto mesmo... Eu ouvi isto? Podem ser as correntes rangendo o chão ao se arrastarem por ele, porque eun ão falei isto acordado".
Coçava a cabeça de seu companheiro e resmungando por um pouco mais de barulho pela casa. Mas já ligara e desligara a TV vezes inúmeras...
"Então, amanhã você vai receber um tormentozinho aqui. Hein? O que você acha?"
O gato deitou-se sob seu peito. Ainda a coçar sua cabeça do companheiro desatou em um mirrado choro de vergonha. Viria habitar mais um bicho naquele espaço protegido das investidas de roedores maiores que seu gato.

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