domingo, 23 de junho de 2013

O FETICHE PELO AUTOMÓVEL/PROTESTOS POR MOBILIDADE URBANA

Sem citar em minúcias, porque seria necessário ter um estudo aprofundado e meticuloso de um dos maiores pensadores que nossa espécie de primata homo sapiens sapiens produziu, o velho Karl Marx, que muito acertadamente nos introduziu um novo pensamento sobre as relações entre homens e coisas/mercadorias (sugiro a leitura de "O Fetiche da Mercadoria", de autoria do alemão citado, como parte de sua extensa obra), quero apenas fazer algumas considerações com a apresentação de números referentes ao fetiche quase sexual que os brasileiros desenvolveram por veículos automotores. 

Quando falo brasileiros, englobo todos nós, inclusive nosso modelo de desenvolvimento calcado na indústria automobilística iniciado pelo governo JK com a implantação das fábricas no ABC paulista. Então, desde lá e até agora, todos os governos de direita, de centro, de esquerda e de seja qual matiz for, nada fizeram, ou fizeram pouco para romper tal paradigma desenvolvimentista, porque mesmo que tenhamos a produção de um biocombustível menos poluente e renovável, como o álcool anidro obtido pelos extensos canaviais em São Paulo e Nordeste, todo o transporte destes veículos é feito por caminhões movidos a... Diesel, subproduto do petróleo, que não é renovável e ainda mais poluente. E o tal paradigma não foi quebrado no sentido de não privilegiar o transporte coletivo.

O que estou tentando dizer é que o transporte individual no Brasil é ainda vetor de "desenvolvimento", paga muitos impostos e emprega muita gente, além de conseguir avanços tecnológicos - que claro, são discutíveis sob um ponto de vista menos individualista. Mas este vetor, creio eu, está se desgastando. 

Vide agora o levante popular ocorrido no Brasil do Oiapoque ao Chuí que teve como gatilho, como centelha, o aumento das passagens do transporte público nas duas maiores cidades do Brasil: São Paulo e Rio de Janeiro; juntas, concentram cerca de 17% do PIB do país. Em uma análise rápida, tal movimento de protestos pode ser relacionado à falta de mobilidade urbana adequada nas metrópoles, grandes e médias cidades Brasil afora. E uma das razões desta inadequação é que os investimentos públicos e privados deixam a desejar na área do transporte de massa, como trens e metrôs. 

De fato, ainda se dão incentivos fiscais, desoneram-se cargas tributárias na implantação de novas fábricas de automóveis e na venda destes, respectivamente. Isto ocorre com trens e metrô? Não.
Os gargalos, os congestionamentos e a poluição só farão aumentar se a médio prazo não for elaborado um novo plano de mobilidade urbana com a implantação deste na cidades com, ao menos, 100 mil habitantes, que somam 288 em todo o Brasil e ~55% de todos os habitantes. 
São as grandes urbes que mais sofrem e são as que tiveram as maiores manifestações pela derrubada do aumento da tarifa de... Ônibus, meio de transporte coletivo.

Para finalizar, apresento alguns números  (valores da frota¹ em milhões obtidos no sítio do DENATRAN, para abril de 2013; o cálculo feito por mim tem por base as estimativas populacionais do IBGE para agosto de 2012. Mesmo havendo um hiato de alguns meses entre as fontes, o fato não é relevante para que os números "melhorem", ou "piorem"):



  frota
hab/veíc
São Paulo
5,884
1,93
Rio de Jan.
2,093
3,05
B.Horizonte
1,310
1,83
Brasília
1,268
2,09
Curitiba
1,201
1,48
Goiânia
0,715
1,86
Campinas
0,672
1,63
Porto Alegre
0,667
2,12
Salvador
0,643
4,21
Fortaleza
0,625
3,99

Para não ficar enfadonho esta postagem com vários números, citei apenas os dez municípios que possuem a maior frota de veículos automotores. Os da segunda coluna se aproximam - ou mesmo já são iguais - dos números de cidades americanas, europeias e japonesas. Mas e os números dos investimentos em transporte coletivo, reitero, são os mesmos das cidades de outros países?

Ressalto que querer possuir um automóvel, por mais fetichista que seja, é legitimamente correto por parte de todos nós; apenas ressalvo que termos mais transporte de massa, com melhor qualidade e quantidade, deveria ser um fetiche "marxista" ainda maior.  

¹ - os números da frota englobam automóveis, caminhões, caminhonetes, camionetas, micro-ônibus, ônibus e utilitários, segundo critérios do DENATRAN)

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