sábado, 19 de maio de 2012

38 - ALEATÓRIAS HISTÓRIAS - ARRUMAÇÃO

Reprodução
Aproveita a sexta em sua manhã, antes de sair de casa, para esquadrinhar a casa em mínimos detalhes como um Google Maps interno em seu castelo invencível (até agora...) e então entrar firme e forte na faxina que deverá ser feita amanhã de manhã. Não se trata de limpeza com água e desinfetante o escambau a 4; mas tão-somente em jogar coisas fora, arrumar armários onde ele guarda fotos, papéis, documentos, cartões e bilhetes; objetos não identificados... Uma arrumação centrada mesmo em jogar coisas que não tenham mais carácter afetivo nenhum.
Na verdade, cobertos de pó, mesmo que trancados a  14 chaves. Alguns deveriam ser esquecidos, portanto  jogados fora. Épocas que se mantêm na mente mas que não precisam ser 'tocadas' pelas mãos, vistas pelos olhos nos objetos e lembradas vividamente.
E teve algumas ao longo das quatro décadas.

Fora assim durante parte de seu ginásio (sim, em seu tempo este era o termo) por ser da turma do meio. Meio da classe, aluno meio bom, meio ruim... Notas médias, dificuldades ali, facilidades aqui. Vivia sempre na expectativa de não ser jogado no limbo da turma do fundão - onde por certo seria motivo maior de chacota -, tampouco ser alçado aos CDFs das primeiras filas - local de vaidade derramada toda aula. Nunca teve certeza de se manter onde sempre se manteve...
O ano letivo fora sempre motivo de desconforto por conta de sua pouca capacidade de se relacionar aos seus iguais nem tão iguais assim. Nas reuniões de grupo, procurava falar o menos possível, nas aulas de educação física fazia de tudo para se 'esconder' e não ser chamado: tão logo respondesse presença, tentava 'evadir-se' do local bem rápido. Nem sempre conseguia.
Mais tarde, anos e anos... Veio a faculdade. Bem, aí sim ele modificou-se, relacionou-se e apaixonou-se pelos livros, teorias e por um amor verteu-se em vida como nunca vertera.

--- Comprar sacos de lixo de 100 litros e jogar tudo isto fora, sem dó nem piedade assim que eu acordar. Vai sobrar algum deles para contar? De jeito nenhum! Não é pouca coisa o que tenho aqui em casa, então para que guardar tudo isto sobre um tempo que não volta e de um tempo que não me diz mais nada, absolutamente nada? Certo, não preciso da resposta. Demorei um pouco mesmo para fazer esta arrumação, mas de amanhã eu não escapo. Chega desta lembranças empoeiradas, manchadas e todas elas de mentira de um tempo de veleidades inócuas que de nada adiantaram. Aliás, meu castelo às margens do fosso do lado de fora vai ficar bem melhor depois de tudo jogado fora. Se eu pudesse jogava pela janela mesmo. Existem algumas delas que tenho verdadeiro ranço ao lembrar. Chega.

Ficará contente em poder realizar isto: uma arrumação em lugares meio escondidos da casa, como gavetas, quarto das tranquiera, maleiros do outro quarto. As fotos serão a primeira a irem para o lixo. Tudo isto cheirando a guardado, infestado de ácaros.
Chega sábado de manhã. De chinelos na fria manhã de São Paulo, ele desce e compra os sacos de lixo e inicia como 'pinto no lixo' a remoção de um passado de tantos sentimentos difusos que produziu...
Fim do dia ele vai estar passeando descalço pela 'novo' apartamento e pensando que "hoje joguei tanta coisa fora" e concluir "que a vida fica bem melhor assim". É aguardar e ver.

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