quinta-feira, 31 de outubro de 2013

VIAGEM CXLIX - MERGULHAR EM CANSAÇO

Reprodução [endereço abaixo]
 Em um mergulho naquela água gelada de um agosto friíssimo, chocando-o com o choque de temperatura, em uma casa que já fora dele. Porque ali, morava seu amor, que morreu, e a casa, abandonada, ficando às moscas até um próximo comprador.

Que compre, mas que talvez seja melhor o tal corretor não contar tudo o que ocorrera por lá: quando o carro saiu da rua e entrou na garagem onde seu amor recolhia restos dos anos passados que deveriam ser jogados fora... Não teve tempo de dar um passo à esquerda, ou à direita e assim se safar da van desgovernada, vazia de gente, com um condutor falando ao telefone, garrafa de vodca ao chão e pronto!.

Entrou pela garagem, bateu no corpo, jogou para frente e passou por cima. Coma? Nada! Morte na hora.
Fora de hora foi quando quiseram dar a notícia para ele que estava longe, quilômetros longe, do outro lado da cidade, quase na rodovia dos Bandeirantes.
Tentaram enganá-lo. Demoraram algumas horas para avisarem de toda a verdade.
Isto foi mês passado. Ele saiu de casa, que já ia ser vendida.

Manteve-se por perto, ao redor, vigiando.
E hoje, quando ainda de folga do trabalho, saiu mais cedo do apartamento alugado - o novo, onde iam morar - e colocou na mochila a sunga tão-somente. 
Dirigiu-se ao carro e saiu apressado. Os apelos de um amigo que fora pegá-lo nem foram ouvidos, como não era de costume.
Abre o portão lacrado. Troca de roupa e por instantes fica pelado, ao sabor do vento de agosto que eriça os pelos castanhos. Dobra-se e pega a peça que trouxera, veste-a. 

O mergulho. Debaixo d'água um silêncio de abismo. Quase uma tranquilidade que se queda esquecida de qualidades presentes. Ele não tem hoje a qualidade querida e desejada a 2 quando do começo de tudo... Dois corridos anos atrás.
Vai de um lado ao outro da piscina, grande parte do trajeto sem respirar; água gelada envolve seu corpo que nem treme por conta disto. De tremer ele entende bem nestes últimos dia: é o que mais tem feito. De dia e de noite quando consegue dormir, acorda tremendo de suor que não sabe precisar se é de frio ou de calor.

Pensando tudo isto debaixo... Daquele azul envolvente, límpido e limpo. 
E vai, volta. E vai, volta. E de novo, de uma margem à outra por uma hora e então vem o cansaço que preguiçosamente o envolve.
Apoia-se na margem onde o sol bate para recuperar a respiração, talvez somente o que possa recuperar daqui para frente. E pensa; o cloro se mistura ao sal das lágrimas e mansamente chora sob o vento de agosto, com o peito para baixo na água fria lembrando-se das noites quentes de verão que nadaram juntos, das noites de amor sob o deck. De gemidos e felicidades. Dos fins de tardes a dormirem juntos de mãos dadas.

A casa será vendida, menos dia mais dia, e ele não quer nem saber deste processo todo: o que lhe sobra, ele vai levar junto na carne. De resto... Mais meia hora de idas e vindas.
Porque ele quer se cansar mais e mais e poder dormir uma última vez ao lado do grande azul cercado por grama verde e pedras cinzas.

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