sábado, 26 de outubro de 2013

VIAGEM CXLVI - CONTANDO AZULEJOS AZUIS

Reprodução [endereço abaixo]
Esquadrinhando. Em um dia de pô-de-sol, em uma primavera quente e abafada, precoce também, ele aquietava-se quando ficava a sós. Escorrendo, escorrendo por cada centímetro cúbico ("ou seriam quadrados?", pensou certa vez) de seu corpo , ele sentado no chão do box. Esquadrinhava com atenção, sem nervosismo, os quadriculados - que eram maioria -, os triangulares e cônicos azulejos azuis com as ranhuras brancas.
E pensava. Tanto, tanto!

Tempos atrás, ele cantava no banheiro, típico clichê de cantores quase amadores: os caseiros. Músicas, as mais variadas, que iam da sertaneja de raiz - "Saudade de Minha Terra", entre as preferidas "... Adeus Paulistinha do meu coração, lá pro meu sertão eu quero voltar..." -, ao rock dos 70, como "Higher Grounder" de Stevie Wonder - "People keep on learnin', Soldiers keep on warrin'..." - até mesmo a assobiar algumas óperas de Verdi ouvidas pela primeira vez com a pompa necessária no Teatro Municipal de São Paulo: e pela primeira vez vestira-se com um smoking de grife italiana. Assobiava fracamente e logo os lábios se secavam; mas não debaixo do grande chuveiro que vertia pesados fios de água morna, tépida.

Mais de meia hora.
Inerte e fechava os olhos agraciando-se apenas com o barulho da água e com o tato em seu corpo desfrutando da correição por ele todo que ela fazia.
Viagem aos mais distantes lugares, não os da geografia de Atlas a segurar o atlas daquela época. Dentro dele mesmo, dentro da mente inquieta, agora quieta, imaginando posições que desejaria, um dia, realizar: sexo, foder e amar. 

O que "despertava" nem seu olhos, nem suas mãos: seu falo, pujante em meio a água que o fazia aprazer-se dos pensamentos insanos que se mesclavam com os assobios.
Dos umedecidos azulejos, ele acabava perdendo a conta de quantos e de quantos detalhes; pelas cores azul e branca ele sentia ser colírio. E então, fechava torneira e de falo em prumo punha-se a secar o corpo naquela agora noite quente. E esperar por quem viria a chegar logo mais. Aquietou-se escrevendo no espelho rodeado por azulejos: "Resolvi esperar você. Contive-me".

http://www.dreamstime.com/stock-photo-blue-bathroom-tiles-image3759060

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