segunda-feira, 23 de abril de 2012

VIAGEM XLVI - AOS SUPERIORES, O TÉRREO

Mal traçado e bem bagunçado. Era assim que tentava escrever toda vez que se dispunha a realizar. Bom mesmo quando saía sem destino - como no filme de 1969 -, sem preocupação alguma com critério algum... Só ele no semi-novo sedã de velho que arfava a chocolate por dentro.
Escreve em um bloco todo amarfanhado que fica no console com uma bic azul quase no fim (de tanto escrever e jogar fora em seguida).
Reprodução

"Para os que têm tudo facilitado, uma serra pontilhada de pontiagudas lâminas resistentes ao esmeril; as fagulhas e o cheiro do metal queimado a cortar, a tanger.
Àqueles que se julgam melhores, sem dó algum o pior para eles.
Para os que são endinheirados/soberbos, a tortura da miséria ; para os pobres de espírito, um 'paraíso' dantesco.
Para os superiores (é o último degrau da escada humana), o limbo; para estes arrogantes, a inteligência da mentira dos melhores mentirosos.
Àqueles 'divertidos' humoristas incorretos, a correção da mudez.
Para a deificação do $, a falta do papel-moeda.
Àquelas pessoas aparantemente lindas só na aparência, a feiura da alma refletida no espelho.
Àquelas pessoas tristes reclamonas, vítimas delas mesmo, a língua cortada.
Aos que judiam dos bichos, pendurados pelos bagos sem a misericórdia da arena.
Para aqueles que destratam, humilham e ignoram, voltem para o fim da fila amarrados para sempre.
Aos que chegam em primeiro sempre, a impossibilidade eterna de concorrer a seja lá o que for.
Para os acadêmicos intelectuais, o canto da sereia irresistível; para os fortes prepotentes pela força física, a careca de Sansão.
Aos detentores déspostas de poderes quaisquer, a servidão absoluta.
Para os idólatras e ídolos, a cegueira do fogo e o gramado seco.
Para aqueles que invejam as belezas, as deformidades.
Aos apolíneos humanos em seus pedestais, a cara no chão, o corpo inerte. Quebrados.
A mim, que parece nunca aprender que o estereótipo é rei por isto é o estereótipo. Um império do sempre, ad infinitum. Continue assim e você vai longe (e vai para onde?).
Aos previsíveis, estetas, hedonistas - junto com os idiotas e torpes -, a feiura da fome.
Aos que vivem procurando iguais, a desigualdade do começo ao fim.
Para aqueles que não sublimam (como ele), a verdade bem sanguinolenta.
Para aqueles que não saem de seu mundo, o universo! Em cima de suas cabeças.
À vida, esta minha, que me fez assim e que faz assim, 'muito obrigado'".

De verdade mesmo, ele não era nada bom em escrever sobre seus sentimentos. Este trecho aí em cima ele maquinara há algum tempo e o adaptava ao seu bel-prazer quando acontenciam recordações, fazendo como melhor lhe aprouvesse. Indicava, pelas letras escritas à mão - só depois que acordara para o mundo digital -, que viver sem se importar com as agruras do mundo tornar-se-ia tarefa hercúlea. E não se importar deveria ser o que comportava a ele.
--- Eu não sou uma ilha! Deveria ser. Mesmo querendo ser uma ilha perdida de Atlântida, eu não consigo, por isto que me preocupo com o andamento do que é feito por aí.
Repetia toda hora, toda hora, sem parar, o que o mantinha aprumado em seu trabalho.

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