quinta-feira, 12 de abril de 2012

TRECHO DE UM CONTO

(este é o início de um conto escrito há alguns anos. Intitulado "Enredando Valores", é um dos meus preferidos - talvez o que mais eu goste).

Reprodução, a mais brasileira das cidades, São Paulo
Mega-cidade industrial vocacionando-se agora no século XXI para o setor de serviços e alta tecnologia, cibernética, consumo de alto luxo, telecomunicações digitais, robótica, nanometria, ruas inteligentes, química fina, turismo receptivo, genoma, células-tronco e todo este equipamento necessário à atividade dos homens do 3º milênio, São Paulo não tem – e poderia ter? – um carnaval como existe em outras cidades Brasil afora. Todas bem conhecidas por razão esta lá no exterior onde o Brasil é ali na dura o país da apoteótica festa pagã. Permanece janeiro chuvoso a época anterior à festa da carne aqui na terra de Vera Cruz do famoso quase iletrado e que parece orgulhoso do fato (será complexo de inferioridade muito mal disfarçado de desdém com relação ao ‘Príncipe da Sorbonne’?) eleito presidente da República dos Tupiniquins. E reeleito! Voltando à questão do carnaval, aqui na Paulicéia Desvairada dos modernistas de 2009 muitas pessoas viajam com destino variado: interior das águas e decerto praia; Salvador – sufoco Barra/Ondina delirante só –, Rio de Janeiro – outro maior em Ipanema/Sapucaí –, Santos, Guarujá, Praia Grande, Ilhabela, São Vicente, Maresias, Ubatuba entram para o rol de opções mil. Verdade: Florianópolis, Balneário Camburiú, Parati e Trancoso andam sempre em voga por estes dias. Todavia, há os que ficam porque trabalham (“... São Paulo que amanhece trabalhando...”, não é?), há os que não trabalham e não viajam. Enfim, a cidade queda-se em uma quietude nada usual para o restante dos 365 dias de ares tão mundiais. 

Na maior parte. Porque na menor parte o paulistano cai mesmo no samba. Ali no centro, na Augusta, na Vieira de Carvalho, a coisa pega fogo com blocos tradicionais. Arde porque a galera toda animada “experimenta” loucuras diferentes para acompanhar o samba, que perdoa muita descontração. E nos bairros que as escolas representam é uma festa atrás da outra, iniciadas já em outubro. Exemplos de grêmios recreativos rivais são a Império Real do Ipiranga, a Tom Paulista – de Pinheiros –, Acadêmicos da Lapa, a Cravos de Prata – da Freguesia do Ó –, a Vigilante do Samba – da Saúde –, e Fanáticos de Itaquera. As outras sete – incluída a idiossincrasia paulistana de haver três escolas de times de futebol – entrarão para fazer figuração. Fulgurante, mas figurarão apenas. Lutarão para que não cavem sua descida em direção ao Grupo B: é o descenso que assombra a todas as agremiações, ou precisamente, quatro, previsto pelo estatuto da Liga Paulistana das Escolas de Samba; que deveria ter sido reformado lá atrás e que por pressão da maioria ainda não o foi. Bem... Agora não interessa a reforma, ainda mais com o carnaval aí, perto, trazendo o furacão. ‘Vamos por partes’, como ele diz imitando seu personagem lúgubre mais admirado. Finalizando: mesmo São Paulo, a megalópole síntese brasileira, tem seu carnaval que é sambado à maneira dos paulistas dos quatro cantos do Estado e de outros vizinhos. E de estrangeiros que vêm aumentando seu espaço nas arquibancadas do sambódromo do Anhembi.
Em um primeiro olhar de um brasileiro que não destas plagas e/ou de um estrangeiro que apareça por aqui pode remeter a cidade a terreno desertificado, tamanha quantidade de calma que se sente no ar. Engano crasso. A cidade tem sua maneira de se divertir de sexta à noite até quarta de manhã. Porque aí então o ritmo cosmopolita da cidade volta à normalidade.

Esfarelado é como ele se sente nestes dias de pré. Um saco... Um amontoado de ossos esfarelados. Tudo porque se a tensão no Anhembi se dará em coisa certa. Leia-se em levar o título de escola campeã, e com nota 10 na bateria, samba-enredo, mestre-sala e porta-bandeira, harmonia, comissão de frente e evolução (aterrador de preocupante). Os mais importantes ele julga. Lógico que no quesito ‘alegorias e adereços’ deveria receber a nota máxima ainda mais pelo fato de ele viver às turras com o carnavalesco que se intitulava o melhor de todo o Brasil e como o tal é o único que o peitava em discussões acerca das fantasias (é a praxe), ele cobrava perfeição.

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