sexta-feira, 30 de abril de 2010

CONTO VIII

Mais um da série Contos. Este chama-se "Reversão à luz do dia". Diria que é o conto que menos sofreu auto-patrulha porque consegui pôr no papel (pelo menos eu acho que sim...) o sentido do sexo para o personagem principal que vive uma vida insatisfatória. 
agradeço, sempre e mais uma vez, a atenção dos webleitores.
Vamos a ele então.

"Na situação de chover e de um avião passear pelo azul da cidade parece haver uma mescla dos dois ruídos formando um terceiro que abarca o que há de urbano-tecnológico ao natural-primário, então, pode-se depreender que a coexistência, para os seus ouvidos e sono, depende deste novo item formado. Talvez soe estranho, mas nestes momentos solitários ali na Aclimação é o que melhor pode lhe acontecer. Humanos falando hoje: não foi aquinhoado com este prazer, a não ser por um fugaz momento logo pela manhã. A voz que ouviu deveria ser bem mais agradável; não foi o que ocorreu. Não por ele, o detentor da voz, mas pela situação [telefone não conta: a voz não está perto, não se vê a boca que emite sons. Bem pensado: temos que “enxergar” (acho que ver não basta) a voz saindo de uma boca e decodificando como e porque esta mensagem foi proferida]. Logo de manhã ele escutou a mensagem que não foi nada animadora, tampouco foi o contrário. Apenas o usual, a praxe comum. Teimoso que é, insiste em se perguntar por quê. Não deve e acaba por insistir. Transtorno obsessivo-compulsivo latente? Incerteza.

Existem os helicópteros, bem parecidos com aqueles protótipos feitos pelo Da Vinci, no século XVI. Tem a impressão que a estética do “veículo” remete com a da libélula, inseto dos grandes e barulhentos. Param no ar, aterrissam em espaços exíguos chamados helipontos. Voam para trás. O gênio do Renascimento previra estes desdobramentos. Hélice gira a rotações altíssimas gerando aquele ruído também para lá de contemporâneo. O do inseto que povoa locais úmidos e alagados (e piscinas) emite um som cheio de zes desproporcional ao seu tamanho ao bater as asas: cabeção, olhos perscrutadores, e um grande abdômen já apresentaram singularidade com o quase invento do gênio italiano (sem falar no apetite famélico que o bicho tem. Aerodinâmica que data de mais de três centenas de milhões de anos; a do helicóptero, o inventado e posto no ar, tem 100 anos incompletos). Imitação que deu certo.

Ilusão pura pensar que somente veículos motorizados, sejam aéreos ou terrestres, podem induzir ao sono em uma urbe faraônica. Elementos naturais e ruídos decorrentes alteram o instável sono tornando-o um tanto mais presente. Chuva, aquela perene, faz bem aos tímpanos; intermitente ajuda a embalar o sono e a montar HQS na mente. Outro natural é aquele da pessoa que dorme ao seu lado. Verdade que um ronco pode mesmo é atrapalhar e até impedir. Bem, depende sobremaneira de como foi o antes de ambos se deitarem, no caso para dormir. Legal de fato é dormir assim, junto, em uma daquelas intermináveis noites de sufocante calor. Melhor ainda se os dois corpos estiverem suados e melados e misturados de gozo. Indefectivelmente, foder com a luz de sol traz um componente... Inusitado, que é o barulho do período diurno mesclado com os sons da foda. Várias vezes ele se deliciou em foder de janela aberta escutando até certo ponto ruídos de aviões, helicópteros e veículos".

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