terça-feira, 27 de setembro de 2016

VIAGEM CCCIV - A FARINHA, A RESSACA E O CORPO

Arquivo pessoal - Centro, São Paulo
Seria um dia daqueles. Quais dias? Bem, daqueles que se começavam mal a chance de terminarem mal - piorar - tornava-se grande e bem provável. 

Um recado em uma de suas mídias sociais havia amargado o dia, igual as carreiras e cocaína que inalara durante o sábado todo; aliás, fora uma verdadeira orgia regada a farinha, uísque e... Bem, sexo meio forçado para as partes, mas este veio com arrependimento tão eficaz que esta era a pior ressaca.

Ressaca! Fazia tudo piorar e fazia o arrependimento também aumentar na mesma proporção: pelo dinheiro gasto - e que não foi pouco -, pela saúde avariada por uns dias e pelos inúmeros cigarros consumidos durante a maratona branca feita com desconhecidos. 

O tal recado, mandado por mensagem privativa, foi uma medida eficaz para que ele se relembrasse dos atos cometidos na noite da farinha muito louca. Nunca havia... Ops, ou melhor, havia tempos que não comprava uma tão boa como a de ontem. Teria valido cada grama consumida, portanto?

Nariz entupido, garganta raspando e a ressaca do cigarro. Parecia que ele arrotava fumaça. Mas voltando ao recado. Quando terminou pensou em ser uma brincadeira daquelas de muito mau gosto. Tentou relativizar o que lera. Olhou em volta e viu o quarto arrumado e limpo, sem nada fora do lugar, a não ser o tubo, o primeiro de vários, de pó jogado displicentemente em cima da escrivaninha. Olhou melhor e viu que ainda continha um tanto de farinha e imediatamente se inquietou.

Consumiu sem pensar  duas vezes com a narina que ainda ficara razoavelmente boa pelo noite de ontem. Vestiu uma bermuda e regata, chinelos, saiu do apartamento, pegou o elevador. Foi até a garagem já bem ligado nos 220w. Sentia-se bem com o efeito da cocaína quando se deparava com algo que tinha ficado incompreendido. Quase se cansou e a respiração ofegava. Verdade que a ressaca ainda se fazia presente martelando sua cabeça.

Dirigiu-se ao carro e com a chave de controle remoto abriu as quatro portas e vasculhou em busca do que o avisaram que deveria estar no carro. E estava lá, no chão do banco de trás: uma calcinha branca, esgarçada como que forçada para retirar e com algumas gotas pequenas do que pareceria ser sangue.

Coração acelerou. Ideias desconexas. E por fim exasperou-se. Abriu então o porta-malas e uma mulher amarada em cordas de varal com sua cueca na boca olhando-o suplicante. Nariz sangrava e ela apenas conseguiu grunhir. Assim que tirou o que lhe tapava a boca ela iniciou a gritaria.

---- Vou pra polícia. Safado! Cheirador louco! Quase me mataram!

Antes que pudesse continuar, ele deu um murro que a fez tontear ainda sentada no para-choque com as pernas balançando. Pegou-a e caminharam até o elevador que, afortunadamente, estava ainda ali. Olhou para as câmeras de segurança e despreocupou-se porque ainda quedavam-se inoperantes. Ninguém no elevador naquele horário foi providencial. Entraram no apartamento e ele a jogou quase desfalecida no sofá.

Em seguida ligou para o seu fornecedor para encomendar pra aquele instante mais do produto. Enquanto isto, usufruiria da mulher como melhor lhe aprouvesse. Aquele corpo combinaria bem com a farinha que estava por chegar.  

A ressaca? Uma dose dupla de uísque terminaria com ela.

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