terça-feira, 25 de outubro de 2016

VIAGEM CCCX - TODOS OS VENTOS DO MUNDO


em cima do edifício mais alto, no heliponto mais elevado de São Paulo, após subir os 40 andares pelo elevador vazio cheio de rangidos, em uma madrugada de outubro, fria para a época, ele em pé, em meio a tempestade que começava majestosa em raios e trovões e relâmpagos, os braços curvados e a roupa pesada...

os dias passam

as pessoas se vão

os vãos ecoam, aumentam,

os ecos se distanciam da realidade

os ratos abandonam

os navios afundam

os rotos roem sobras

a chuva cai pela madrugada

os sonhos vem

eles embalam dias melhores

que não virão (?)

os sonhos em cores, sem dores povoam

os tratores da vida aram a terra aqui dentro

e lavram fincando raízes, criando caminhos

recônditos, sinuosos e profundos

as ondas vêm, voltam, lutam, batem nas rochas

os rochedos resistem braviamente 

as rimas desaparecem

os versos versados em amor vagam

e os ventos que levam, trazem, arremetem?

todos os ventos do mundo ali convergiram

e em alguns instantes ele levitou centímetros do chão

(sem magia, sem truque)

sentiu seus pés balançarem e os sapatos pretos afrouxarem o aperto

(os cadarços pareciam desamarrados)

quis ficar assim: os ventos do mundo ventando

ele levitando sozinho

as nuvens carregadas plúmbeas

raios ao longe, trovões graves por ali

sentia as gotas chicoetando seu corpo

e então... ele caiu no centro do heliponto

desfaleceu-se, mas antes os pingos lhe escorriam pela careca

pela barba ruça hirsuta e pôde então dormir

até que seu ouvido encharcado de água o acordasse tempo depois

e ainda todos os ventos do mundo estavam ali

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