em cima do edifício mais alto, no heliponto mais elevado de São Paulo, após subir os 40 andares pelo elevador vazio cheio de rangidos, em uma madrugada de outubro, fria para a época, ele em pé, em meio a tempestade que começava majestosa em raios e trovões e relâmpagos, os braços curvados e a roupa pesada...
os dias passam
as pessoas se vão
os vãos ecoam, aumentam,
os ecos se distanciam da realidade
os ratos abandonam
os navios afundam
os rotos roem sobras
a chuva cai pela madrugada
os sonhos vem
eles embalam dias melhores
que não virão (?)
os sonhos em cores, sem dores povoam
os tratores da vida aram a terra aqui dentro
e lavram fincando raízes, criando caminhos
recônditos, sinuosos e profundos
as ondas vêm, voltam, lutam, batem nas rochas
os rochedos resistem braviamente
as rimas desaparecem
os versos versados em amor vagam
e os ventos que levam, trazem, arremetem?
todos os ventos do mundo ali convergiram
e em alguns instantes ele levitou centímetros do chão
(sem magia, sem truque)
sentiu seus pés balançarem e os sapatos pretos afrouxarem o aperto
(os cadarços pareciam desamarrados)
quis ficar assim: os ventos do mundo ventando
ele levitando sozinho
as nuvens carregadas plúmbeas
raios ao longe, trovões graves por ali
sentia as gotas chicoetando seu corpo
e então... ele caiu no centro do heliponto
desfaleceu-se, mas antes os pingos lhe escorriam pela careca
pela barba ruça hirsuta e pôde então dormir
até que seu ouvido encharcado de água o acordasse tempo depois
e ainda todos os ventos do mundo estavam ali
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