quinta-feira, 31 de maio de 2012

VIAGEM LIV - ATROPELOS

Térmitas transitam por todo aquele espaço de terra avermelhada,
que de tão dura antes, que as provocou a roer, a roer, a roer... 
E agora, quase como areia, há marcas rasgadas neste chão.
Igual àquela peça que eu te dei, ficando toda esgarçada, com bolinhas
e você continua a usar.
Tratamento cuidadoso na hora que você vai lavar.
Diz que sempre lembra de mim. 
"Não é, então, para ir junto a todas outras peças".

Um mapa na camiseta, um mapa na blusa, um mapa no seu coração.
Bem mais perto. Sempre digo isto. E você concorda com a cabeça e me toca com suas mãos repletas de desejos.
Vindas de tantas histórias, de tantos outros toques.
Eu também tenho um passado ruidoso, de raiva e talvez rasteiro.
(como os insetos)
Sei um tanto do seu e por mim é tranquilo ter estas informações.
Passaram e ficam cada dia mais longe enquento nosso amor fica cada vez mais perto.
Sem roer nada para minar porque é tudo muito coeso: você eu.
Podem transitar aquelas insetozinhos mínusculos como fizeram na dura rocha.
Que não vai roer nossos braços e abraços, nossas bocas e beijos, 
nem arruinar a nós.

Estampado o tal mapa no peito, o tesouro é aquele que está
diante de meus olhos todos os dias de manhã quando passa em casa para o café juntos.
Aos fins de semana, em meio ao trabalho que temos às vezes, 
podemos acordar na mesma cama.
Tepidamente... Sem pressa de ir ali ou começar algo.
Só se for algo que possa fazer por você.
Depois de minutos saboreando o quarto por estarmos ali,
saio pé ante pé para não lhe acordar antes da hora e poder
fazer algo por você.
São estes os dias que mais gosto: os normais, quase previsíveis por inteiro, sem atropelos. Somente os... Aqueles que são nossos.
Ficamos com os verticais e horizontais.

terça-feira, 29 de maio de 2012

VIAGEM LIII - INSTRUMENTOS ELETRÔNICOS

reprodução
Das canções de sempre, aquelas que sempre ouviu e por certo ouvirá pelo resto do tempo que ele supõe ter porque, por certo, não terá muito deste tempo suposto.
Tantas passaram e ainda muitas passarão pelos ouvidos: com violinos, teclados, guitarras, alguma percursão, saxofones e os grandes violoncelos.
Tem os nomes dos cantores e compositores e intérpretes que mais gosta na ponta do ouvido e cantando - sempre no semi-novo sedã de velho - sozinho para não ter que se 'encrencar' com algum empresário que o ouvisse e quisesse contratá-lo. Com sua voz grave e soturna. Cinza, ele pensava que era, mas de um cinza forte, imponente. E soturno.
Eletronicamente depois, eletrizou-se pelas horas da madrugada escutando em som alto o reverberar pelo grande caixa de ressonância que havia se transformado em meio ao tempo da fumaça nas pistas. No outro dia ficava dolorido de tanto que dançara.

De vidros fechados presta atenção no trânsito e canta junto ao rádio. Programas com horas seguidas e pouca fala de locutores são os que mais lhe são aprazíveis. Longas músicas instrumentais dançantes.
E para por aí... Para os outros. Para este cara só observador porque ainda não age: quando resolve não mais observar, derrama-se em agir poupando àqueles muitos que decide sempre sem critério e os outros "poucos, mas bons" (como sempre pensava ironicamente) que têm a escolha de não poder escolher como escapar.
Quando acontece ser tragado em algum congestionamento nos horários de pico, desliga-se do lado de fora - o lado do mundo a ser consertado - e fica centrando atenção nas músicas e à prpcura daquele chocolate americano perdido pelo carro recém descoberto nas prateleiras de supermercados: seu novo tesão. E porque também tem mais que um tipo no carro. Alguns com amendoim em tabletes grandes fazem maravilhas no seu humor.
Nem se apressa ou bufa como outros por aí preso no trãnsito. 

--- Bem, o trânsito não é ruim: eu sou ele também, então deve haver alguma parte boa nisto aqui. Reclamar para que? A pé é que não vou andar porque de nada serviria para executar o que tenho quye executar. Vejo a cidade pelos vidors. Desço, claro, para execurtar, como falei. E só. 
Agrega quase toda noite - em geral é neste período do dia que ocorrem as 'execuções' feitas - uma nova música ao seu repertório vasto como o vão do MASP. Abandonar as antigas antes soía impossível, mas agora tem espaço e tempo para todas elas; mesmo que o tempo, se ele for programar a vida a longo prazo, tenha tornado-se menor por razões inúmeras: sim, as verdades criadas em suas psicoses tão humanas. "Todos nós temos e eu não sou diferente. A diferença é que eu trato de mi mesmo. E funciona!"
Verdade, depois de tudo o que fez no passado, com sóis vistos por tantas manhãs quentes e geladas pela dcidade afora, os dias podem ser vistos logo ali. "Falo dos dias finais". Relembra-se de olhar algumas vezes de longe do centro e de cima dos prédios, também por baixo com a cara no chão em calçadas e chãos de quartos.

Vestido com roupas do dia anterior, via andando às ruas os noticíarios pelo vidro dos bares e quando havia coragem, entrava e postava-se no balcão para melhor observar. Tudo passado e hoje, um homem melhor que antes, dá-se bem toda vez que limpa um pouco o mundo das pragas que habitam o planeta
Ruminava à época dos balcões fazer o que hoje faz com perfeição nunca praticada por ele. 
Ri como parecia e era amador porque para conquistar o domímio completo sobre si mesmo, demandou-se tempo. Por isto o tempo vem cobrando agora a fatura dos dias.

segunda-feira, 28 de maio de 2012

MAIS 2 TRECHOS DE 1CONTO

2 trechos do conto "Enredando Valores; narra os preparativos de uma escola de samba para o desfile no Anhembi, em São Paulo, desde janeiro até o grande dia. A história gira no entorno do personagem principal que é o presidente da agremiação; outros personagens são secundários. ele tem um jeito muito especial de comemorar".

Durante as reuniões do maldito conselho ele se arrependia toda vez em que uma começava. Estes ares democráticos foram implantados em 2003, no primeiro ano de sua gestão, pois via uma forma de assim conversar e ouvir mais a velha guarda. Ele crê que o homem só chega ao consenso pelo exercício da massa que está dentro da cabeça; se quisesse poderia dissolver o conselho de rapina e governar por decreto porque conta com apoio amplo no “lumpen proletariat” da agremiação. Mas não o fará, pelo menos não em 2011, um ano após sua reeleição (apenas uma é permitida). O arrependimento advinha da razão de que nos ‘encontros’ aconteciam discussões impróprias e muita masturbação mental. Um dos abutres, o mais novo deles, com certeza se oporá ao padrinho porque, ainda que jovem, é de uma teimosia rara. Um asinino empacado no meio do caminho dos tropeiros. O problema, mais um, é que este controla outros dois votos, fora o dele obviamente.

Só que o plantonista de carniça não conta que hoje o presidente vai bater de pau duro na mesa e bancar a controversa mudança.

Tal hora da bendita reunião não chega. E ele conta com algum tempo para efetuar pressão em uma das esganiçadas. Há moeda de troca no caso porque a citada desfilará no mais alto carro alegórico, o da 5ª ala, e a fantasia é a mais cara dentre os 3.300 integrantes da Unidos. Então... Ele tem bons motivos para convencê-la.

E, em se tratando do conselho... Consistia em 10 membros heterogêneos em vários aspectos. Os mais decanos possuem uma posição perigosa no que se refere às mudanças como esta da bateria, quesito tão tradicional em qualquer escola. A bateria nota 9,5 em 2008 causou impacto. Até hoje este 0,5 ponto perdido foi porque o maestro reticente era em promover a famosa evolução – e inovação - no recuo que todas as outras fazem. 

Parente de um anterior fora convencido ao longo do ano que a evolução tinha que ocorrer. Argumento de convencimento foi que em dois anos como mestre da bateria ele já teve um 9,5. Imperdoável. Seu cargo ficou na corda bamba em ultimato até julho. Curvou-se e acabou por gostar da idéia e promoveu um recuo bem ensaiado e em seu entendimento inovador. E há que se registrar que a bateria conta com 30% de mulheres, índice inigualado por nenhuma outra.

(...)

Pelo menos nas cores oficiais não haverá mudança, o que ele também nem deseja: laranja e azul celeste. Todas as seis alas terão variações nestes dois matizes indo do pastel até o brilhante. Prata era uma terceira cor não oficial, todavia compunha-se bem com as outras. Confessava a si mesmo que as fantasias dos destaques e a montagem dos carros alegóricos, quase prontos, nunca estiveram tão aprumadas e luxuosas. Uma das gralhas, aquela do destaque – o mais alto a quase cinco metros de altura - contemplava um esplendor raramente encontrado nas escolas paulistanas. Porra, caro que só vendo. E é lindo que dói.

Ambas as cores foram incluídas, ou melhor, substituíram as anteriores logo em 1964 quando do golpe de Estado contra Jango – contra o Brasil, na verdade: vermelho e branco. Não pelo branco, evidente, mas o vermelho sofreu certa pressão do ‘querido’ e ‘amável’ DOI-CODI de São Paulo. Disseram à época que não pegava bem uma escola tão representativa ter o vermelho como oficial e que algum ‘desavisado’ poderia relacionar com a cor dos sovietes supremos de 1917. Hoje ele vê como engraçado o fato do bolchevique Lênin poder ter seguidores com samba no pé... Na “intelligentsia” da agremiação a história sempre é motivo de picardia.

Bem, a reunião começa. A qüinqüelíngüe lê a ata anterior para certificar os participantes quais as deliberações feitas e a pauta da reunião de hoje. Enumera os itens. Ele, na cabeceira da grande mesa de vidro blindex fumê observa, entremeado de goles d’água, as reações da mula empacada e de dois possíveis de serem cooptados. É a harpia monitorando os abutres. A reação dos intransigentes está sendo como ele esperava e pensava durante a tarde toda. Vociferam contra acrescentar um padrinho junto à madrinha da bateria (ainda bem que o samba-enredo escolhido em junho teve maioria aclamatória inconteste no conselho e na final realizada na quadra em uma noite de sábado de garoa e frio intenso). Pensou que menos mal. Quanto à mudança, ele refletia, podem falar e gritar porque será do jeito que ele quer. Esperneiem, descabelem-se, urrem e xinguem.

sexta-feira, 25 de maio de 2012

VIAGEM LII - ANDANDO NA CORDA BAMBA

Reprodução
Os caras de lá, bem de longe, em algum extremo distante daqui, são como lágrimas
a escorrer pelos cantos dos olhos
salgando toda a face, que um dia, já foi beijada, lambida. Amou-se o corpo e a mente e as qualidades e os defeitos.
Hoje, pedem com a voz rouca de gritarem por tantas vezes, por um pouco de sossego
sem que isto atrapalhe o sossego de outros poderosos 
e fanáticos por qualquer motivo que seja.
Os caras daqui não se preocupam muito com os caras de lá.
Nem poderiam porque afinal, cada um deve cuidar de si mesmo. E porque aqui, como acolá, ou lá, nada é muito fácil.
Os caras de lá não exercem seus direitos porque nem ao menos eles os têm.

E não têm porque a eles palavras são jogadas com a desculpa de se estar realizando o correto, o que deve ser aceito sem pios.
E qual é o correto?
Bem, o correto é o que lhe diz sua consciência aliada a empatia pela dor que o outro pode ter. Retidão de carácter é um amálgama disto.
Um humanista verdadeiro se importa com todos os caras. Do mundo todo.
Resolver-se-á o problema com esta preocupação? Por certo que é pouco, mas é algo palpável sim.
Saber que do lado de cá, ou do lado de lá, existe alguém que se compadece de sua aflição deve ser um motivo de...
Vitória. 
Não a uma vitória de Pirro.
Não uma vitória contra o carrapato, que para matá-lo, mata-se o boi.
("todo mundo é parecido quando sente dor")

Os caras de lá são cidadãos de 3ª classe.
Nem o amor contido neles pode vencer uma vida de aflição, de preocupação, uma vida de "sempre ter que estar alerta contra tudo e contra todos".
Assim não se vive. Assim se sobrevive tão-somente, beirando o abismo sem fundo. Ali, estão na corda bamba que liga o outro ponto do lado de lá do abismo: a felicidade.
Equilibrando-se de maneira tenaz para não caírem.
Alguns caem - indefectivelmente caem. 
E são esquecidos no limbo da memória dos outros.
Estes caras já se foram. E foram derrubados ao balançarem a corda em ambos os extremos.
Só para lhes tirar a chance - vejam bem, a chance: não a certeza - de poderem ser felizes.

terça-feira, 22 de maio de 2012

VIAGEM LI - KM³ DE GELO

Reprodução, a vastidão de gelo na Antártida
No semi-novo sedã de velho recendendo a chocolate derretido, o passeio pelos dias de frio na megalópole paulistana tornam-se ainda mais introspectivos. Aprendera a ser assim porque dos outros cansara de esperar qualquer coisa que fosse além da duramente imbatível traição.
Das lutas inglórias, poucos querem e resistem. E glórias a eles.
Deveríamos entoar loas de paixão profundas pelos embates que travam contra X, ou contra Y e o pior deles, contra nós mesmos.
Facilidades existem em qualquer ponto deste planeta, seja no gelo quilométrico ao ³ da Antártida, duro, resistente e difícil... Seja na densa Amazônia ou nos milhões em São Paulo. Elas precisam ser descobertas pelos relés mortais e tomadas de forma desnuda para que as possuamos - as facilidades, porque são para poucos privilegiados.
Quanto às dificuldades, elas estão perto, ao seu lado, fustigando sua luta, ofuscando as facilidades e criando medos e complexos e não há muito o que se fazer contra isto.

--- A menos que você nasça rico, milionário e por isto, desligar-se do mundo e então viver longe deitado eternamente em um banco esplêndido de $. Porque eu não ia massacrar ninguém, não ia oprimir ninguém. Porque nunca fui dado a tal. Só balançar-me-ia embaixo de alguma sombra em um dia de calor. Faço o que faço porque levo uma vida bem parecida com as dezenas de milhões de brasileiros. E latinos né? Paraguaios que o digam, são dos mais sofridos. Pelo menos não têm um cocaleiro dos infernos na presidência que não come frango.

Ser pobre ficava a anos-luz de sua condição. E por isto, tomara para sim a inglória luta de melhorar o mundo da imundície que outros deixam e espalham por aí: são encardidos como andar de meias brancas pela casa.
Golpes para lá, golpes para cá e ele mesmo golperara-se por tanto tempo, malhando em ferro frio em tentativas de estabelecer um relacionamento - sim, ele teve um, na verdade, alguns, muitos anos atrás - para juntar calor nas noites gélidas de inverno. No verão, mistaravam-se em suor derramado pela cama, pelo chão e o gelo fino, leve e fácil, passeava por sua bocas indo de uma para outra sem pecado. 
Dedicou-se, esforçou-se, porém nada disto foi suficiente para que não se criasse de forma crível o gelo que os separou. Recorda-se do dia que se estatelou no chão gelado quebrando o nariz manchando o piso branco brandamente de sangue; o vento frio piorou  o machucado que soía queimar como fogo. Olhou para cima e viu os pés se  afastarem, os passos mais longe, quase inaudíveis. Trair é assim: quem se ama vai embora.
Amargura tomou conta dele no passado, hoje o sentimento é de frieza e certeza.
O caminho de hoje será bem longo. Muitos passarão por ele e todos, absolutamente todos serão pegos indefectivelmente. Verão como o gelo cúbico pode ser mais duro que aço (o que ele faz não denota raiva, como pode indicar... Para ele é um sentimento de justiça exacerbado porque o mundo exige assim nas entrelinhas de letrinhas miúdas do contrato que se estabelece quando se é posto para viver neste pó do universo).

sábado, 19 de maio de 2012

38 - ALEATÓRIAS HISTÓRIAS - ARRUMAÇÃO

Reprodução
Aproveita a sexta em sua manhã, antes de sair de casa, para esquadrinhar a casa em mínimos detalhes como um Google Maps interno em seu castelo invencível (até agora...) e então entrar firme e forte na faxina que deverá ser feita amanhã de manhã. Não se trata de limpeza com água e desinfetante o escambau a 4; mas tão-somente em jogar coisas fora, arrumar armários onde ele guarda fotos, papéis, documentos, cartões e bilhetes; objetos não identificados... Uma arrumação centrada mesmo em jogar coisas que não tenham mais carácter afetivo nenhum.
Na verdade, cobertos de pó, mesmo que trancados a  14 chaves. Alguns deveriam ser esquecidos, portanto  jogados fora. Épocas que se mantêm na mente mas que não precisam ser 'tocadas' pelas mãos, vistas pelos olhos nos objetos e lembradas vividamente.
E teve algumas ao longo das quatro décadas.

Fora assim durante parte de seu ginásio (sim, em seu tempo este era o termo) por ser da turma do meio. Meio da classe, aluno meio bom, meio ruim... Notas médias, dificuldades ali, facilidades aqui. Vivia sempre na expectativa de não ser jogado no limbo da turma do fundão - onde por certo seria motivo maior de chacota -, tampouco ser alçado aos CDFs das primeiras filas - local de vaidade derramada toda aula. Nunca teve certeza de se manter onde sempre se manteve...
O ano letivo fora sempre motivo de desconforto por conta de sua pouca capacidade de se relacionar aos seus iguais nem tão iguais assim. Nas reuniões de grupo, procurava falar o menos possível, nas aulas de educação física fazia de tudo para se 'esconder' e não ser chamado: tão logo respondesse presença, tentava 'evadir-se' do local bem rápido. Nem sempre conseguia.
Mais tarde, anos e anos... Veio a faculdade. Bem, aí sim ele modificou-se, relacionou-se e apaixonou-se pelos livros, teorias e por um amor verteu-se em vida como nunca vertera.

--- Comprar sacos de lixo de 100 litros e jogar tudo isto fora, sem dó nem piedade assim que eu acordar. Vai sobrar algum deles para contar? De jeito nenhum! Não é pouca coisa o que tenho aqui em casa, então para que guardar tudo isto sobre um tempo que não volta e de um tempo que não me diz mais nada, absolutamente nada? Certo, não preciso da resposta. Demorei um pouco mesmo para fazer esta arrumação, mas de amanhã eu não escapo. Chega desta lembranças empoeiradas, manchadas e todas elas de mentira de um tempo de veleidades inócuas que de nada adiantaram. Aliás, meu castelo às margens do fosso do lado de fora vai ficar bem melhor depois de tudo jogado fora. Se eu pudesse jogava pela janela mesmo. Existem algumas delas que tenho verdadeiro ranço ao lembrar. Chega.

Ficará contente em poder realizar isto: uma arrumação em lugares meio escondidos da casa, como gavetas, quarto das tranquiera, maleiros do outro quarto. As fotos serão a primeira a irem para o lixo. Tudo isto cheirando a guardado, infestado de ácaros.
Chega sábado de manhã. De chinelos na fria manhã de São Paulo, ele desce e compra os sacos de lixo e inicia como 'pinto no lixo' a remoção de um passado de tantos sentimentos difusos que produziu...
Fim do dia ele vai estar passeando descalço pela 'novo' apartamento e pensando que "hoje joguei tanta coisa fora" e concluir "que a vida fica bem melhor assim". É aguardar e ver.

quinta-feira, 10 de maio de 2012

VIAGEM L - POÇÕES

Mentiras ditas, aos montes.
E a bondade? A mansidão?
Longe, por pouco vísivel, e
distante, a anos-luz de mim e de você.
Aos trancos e barrancos lutávamos a favor
de tudo que nós construíramos
ao longo deste tempo de estar junto,
de sentir o que o outro sentia. O sentimento de empatia cresceu e tomou nossos corações.
Longe, agora está lá trás.
Víamos ao mesmo tempo tamanha cumplicidade
em querer algo parta nós.
Nunca era só eu ou só você.
e mesmo assim, havia coisas em você que eu desconhecia.
Motivo para querer saber mais e mais.
Para lhe conhecer melhor e te confortar,
acalentar, amar e fazer suar.
Rumávamos de mãos dadas, firmes apoios sob o vento que causava tempestades.

Nas manhãs, via você dormindo e tentava imaginar o que sonhava: quimeras, utopias, fantasias. Só tranquilidades?
Comigo? Nós dois?
(às vezes, confesso, chegava perto para poder escutar de pertinho, sentir cheiro enquanto dormia)
Olhava seu corpo, ouvia sua respeiração profunda e pausada. 
Espalhava-se pela cama como quem sabe que pode se espalhar 
e tomar conta de parte do território.
E me deleitava em lhe ver ali, onde tudo era nosso. Sua parte naquilo tudo: a metade deste mundo,
que ao longo dos dias estabelecemos.
Todas as poções de ilusão caíram feito um cartas desmontadas pelo vento. 
Reais tudo o que fazíamos e éramos.
Então, quedávamos mais fortes e mais fortes...
Hoje, depois que se foi para um outro mundo, fico pensando acordado,
na cama que sempre fora nossa, como o mundo ficou pequeno nos interesses.
E grande na minha saudade.

segunda-feira, 7 de maio de 2012

VIAGEM XLIX - DESGOVERNADO

Reprodução, Pinóquio
O que é o ingovernável?
Uma paixão "cruel, desenfreada" ladeira abaixo?
Um assassinato? Um suicídio?
A mente da cada um é ingovernável? Os ideais de um homem?
(ou é tudo fantoche, uma grande mentira?)
Roubando esta cena - que poderia ser burlesca, mas é real e patética -, vem aqueles que se dizem os praticantes da governabilidade extrema, com rigor de austeridade que nem mesmo o canalha alemão nascido na Áustria poderia imaginar (e notem que o 'talzinho' governou ferreamente até ser destronado... Isto é que é patético: eles sempre caem, não antes de maltratar muitos de nós; mas caem)
Quem está lá encastelados em suas cidadelas protegidas da grande turba de desgovernados esquálidos não tem a noção extara do que é estar no maior grupo e ter muito pouco para disputar; o que repete os caras lá do alto das torres controlando o 'resto'.

Governar suas vontades e anseios traduz-se mitologicamente como os 12 trabalhos de Hércules: de tão difícil, os desgovernados supõem ser impossível. Afinal, estes são "fracos" e quando assim, é para sempre. Mas o grande herói e semi-deus grego fez com aplicação que deve ter assombrado até mesmo Zeus, olhando de cima do Olimpo.
Maiorias aqui, minorias lá, empate acolá. E vamos parar onde diante destes números, porcentagens, X casas depois da vírgula, coeficientes...? E os corações que ficaram pelo caminho? (estes têm agora uma linhagem de 'perdedores'?).
Negocia-se tudo: negocia-se a vida, o amor, o corpo, a mente, a ética e a moral de cada um. Recorrendo novamente ao grande passado grego, todas estas negociações são como o canto das sereia no Egeu de tormentas: você vai morrer de alguma forma. Este morrer - sem ressurreição - em nossos valores é uma morte lenta, a conta-gotas e transforma-o em mais uma da grande massa de desgovernados.
Seremos então ingovernáveis us contra os outros em uma rinha de terra onde haveremos de nos defender com as esporas colocadas forçadamente para que possamos ser governados pelos mentirosos que existem e que comandam o mundo e os sentimentos.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

VIAGEM XLVIII - EUROPA: PARECE DESEMPREGO, MAS É SÓ TRISTEZA

Reprodução, braços dados em Atenas
Em Atenas há uma ebulição, um verdadeiro rebuliço contra o desemprego. Diferente do que ocorre em Madri, em Lisboa, em Dublin, na eterna Roma ou mesmo na "chique" Paris?
Pessoas desesperadas com anseios de poderem tão-somente se sustentar neste que é um sistema capitalista que privilegia os mais poderosos, os que chegam sempre em primeiro (aliás, chegar em segundo, segundo aquele corredor de F1 brasileiro falecido há 18 anos, é "ser o primeiro dos derrotados". .. Para ele, decerto! Eu nunca li algo tão idiota em toda a minha vida e tão carregado de soberba - mas isto é outro assunto), com o adendo que "está triste? Vá chorar na cama que é lugar quente".
Depois de anos empunhando a bandeira do berço da civilização ocidental, da qual eu, você e os direitosos truculentos e esquerdopatas inclusos, fazemos parte - goste-se ou não - a Europa mergulha em uma crise sem precedentes. Quase 1/4 dos espanhóis em idade de trabalhar está desempregada, Portugal a taxa é de 15%, Grécia perto dos 20%.
Números, números e mais muitos números. E as pessoas? O que fazer com elas? Jogá-las mar adentro ou pelo Olimpo abaixo de pouco servirá... Se os bancos e governo fizerem isto como elas irão consumir mais tarde?
Agora que chuparam até o caroço, o mercado deve jogá-las fora. A manga foi consumida até o talo com voracidade poucas vezes vista. Bem, como são caroços e sem serventia ao mercado globalizado há que se dispensá-las. 

E os sonhos? A vontade de crescer? Os anseios? O riso?
Vidas que caminham ao sabor do grande sistema; sistema este que possui o mais belo canto da sereia em noite escura de tormentas pelo Egeu, como reza a lenda. Seduz e sevicia cada um de nós emaranhando-se em nossa ética e moral este sistema.
E não há outro não é? (porque aquele sistema cubano, ou mesmo o chinês e correlatos - leia-se o bielorusso, iraniano, saudita, birmanês -, carece de qualquer menção honrosa).
Pelo menos pode-se ir às ruas e protestar de braços dados para aumentar a força transmitindo uma mensagem de solidariedade mútua, significado que está prestes da nulidade nos dias de hoje. Braços enganchados uns aos outros conferem aos seres humanos uma simpatia maior em muitas pessoas deste planeta: solidão a dois, a três ou aos milhares pode ser mais suportável (pior para os solitários embrenhados em sua densa floresta de horrores  encarcerados em suas depressões mais cinzentas).
O motivo para os braços dados é de uma tristeza sem-fim. Desespero em alta, auto-estima em baixa e o bolso oco; dívidas e pagamentos. Saque e fome?
A imagem é tocante porque espelha outros milhões de homens que perderam seus empregos e por consequência parte de sua vida: além de resgatarem bancos e parlamentos, quando resgatar-se-ão as pessoas?

(Aqui em "Terra Brazilis" tudo corre conforme Brasília quer e conforme Brasília dita. Copa, Olimpíadas e o "pleno emprego" keynesiano. "É o país das maravilhas")

37 - ALEATÓRIAS HISTÓRIAS - O PASSEIO

Reprodução
Deitado desta vez na grande cama cada vez maior com o passar do anos, observa pela janela a garoa fina, fina, dando um cara estereotipada a cidade de São Paulo. Imerso em pensamentos sonolentos montando os dias que se seguirão depois que ele despertar; acomodado em meio a travesseiros com o conselheiro-mor do castelo deitado em uma das pontas já em seu 5º sono felino. "Também, dormem mais da metade do dia esses gatos. E os primos grandões também". 
Grosso e pesado edredon  o aquecia do longo inverno que virá, como tantos outros vieram (torce para que seja bem igual aos anteriores, sem surpresas; não é do tipo que gosta de surpresas).
As pessoas nas ruas, o frio, a sopa quente, gripes, resfriados, muita roupa.
O Rex, e para variar, deitara-se no chão sob o tapete felpudo. Seu primeiro inverno, na verdade sua primeira onda de frio que veio, para variar, da Argentina, do Atlântico Sul, da Antártida ou alguns destes lugares frios e distantes.

Somente uma fresta da janela aberta. A porta escancarada para melhor dominar todo o resto do castelo enquanto estivesse dormindo. Para ele, dentro de casa não há trancas.
Sobrancelhas franzidas e um leve tremor no queixo em um instante seguinte. Mas não é o frio.  Preocupações que antes não lhe ocorriam deram por aparecer questionando sua mente a atormentando sua consciência. Desprovido das respostas, fechou os olhos.
(onde foi parar o "cara sonolento" de minutos atrás?)
Outras coisas povoam sua mente; mas o leve estresses se desanuviou porque o conforto proporcionado por sua cidadela intransponível o fez relaxar em seguida.
Parece-se como quando ele fica a balançar os pés, receita antiga para embalar seu sono que dura minutos e o sono vem.
Felino muda de posição e esparrama-se mais. O príncipe ressona somente como os filhotes ressonam.
Tudo em seu mais calmo silêncio. O vento agora começou a soprar e então, a chuva de outono - abrindo o inverno com antecipação? - cai pesadamente, em pé, pelo que pôde observar antes de dormir.
Pronto, agora já foi.

"Consegue 'sentir o cheiro' ao respirar a umidade no ar e o bafo quente de sua boca faz fumaça naquele início de manhã. De qual manhã ele não tem a mínima noção. Deve ser porque percebe pela posição do pálido e relutante sol que há uma significativa inclinação em sua sombra.
Barulhos quase nenhum, talvez ainda os bichos estejam escondidos em suas tocas dormindo demorando-se mais a levantar e enfrentar o frio.
Chão molhado, como das outras vezes, e os pés brancos com dedos delgados esparramados não sentem frio. Sim, o chão está gelado e muito.
'O que faço eu neste lugar frio e úmido, descalço? Devo ser louco mesmo por andar deste jeito sem calçar botas. Porque estou fazendo isto agora? Este caminho é idêntico ao de antes, mas porque então eu não sei para onde esto indo?'
Perguntas, perguntas... Melhor seguir o caminho e não se preocupar com questões que não podem ser respondidas agora sendo que há muito esperam resposta.
Longe, quase inaudível, o canto de pássaros avisando sua chegada. Ele, meio desajeitado, faz barulho em caminhar e mesmo distante das aves, eles o percebem e soltam seu canto de alerta

A trilha segue sinuosa, com altos e baixo, com a vegetação espessa: muitas árvores de tamanhos variados de folhas verdes, de troncos grossos e retorcidos, outros finos e apontando para o céu. Folhas secas marrons  Flores somente algumas. Galhos partidos derrubados por alguma tempestade, ou por velhice cobrem-se de cogumelos de cores contrastantes com a cor dominante. Pelas suas contas está andando sem se cansar já tem mais de uns 30 minutos. 
Reprodução
O sol resiliente que é como astro-rei está virando o jogo. Vem a parte reta do caminho e logo ali o seu castelo de pedra.
'Perto daqui foi onde os romanos mais ao norte chegaram deste país enevoado e gélido. E devem ter sofrido muito com este clima bem diferente de onde vieram e do costume de se vestir. Não deve ter sido fácil para se carregarem com tanta roupa, carregarem as armas e a obrigação de vencer jutos e pictos. Mas mesmo assim fizeram por mais de 400 anos, os melhores que foram. É o que eu sempre digo: os maiorais'.
E o castelo, com o fosso transbordando e sem sinal daqueles roedores bigodudos da peste, e que fora construído alguns séculos mais tarde, queda-se cada vez mais um refúgio onde ele pode descansar destas caminhadas que frequentes que se tornaram fizeram que ele se acostumasse com o frio nos pés. Um ineditismo porque é a parte que ele mais sente frio. Mas não aqui, não naquele caminho.
E repetidas vezes construía-se assim tudo isto: de repente ele estava no meio desta mata fria e úmida, caminhando descalço seguindo por um caminho onde não encontra ninguém.Um fato é que hoje está mais frio e demorou mais para chegar ao castelo.
Rangendo como uma velha porta alta que é, na sala a grande e assustador fato novo: lá estão o veterinário que cuidou do Rex e o balconista da padaria que ele toma sua média toda manhã.
'E porque vocês estão aqui?'
Sem resposta e sem sentido as visitas estarem ali"

Pela manhã que se segue a chuva cai forte e a ouve logo que abre os olhos. O despertador da TV nem precisou acordá-lo e ele se levanta para ir ao banheiro. Antes, cobre o Rex com uma cobertor. Felino nem sequer se mexe todo enrodilhado no edredon que está.
--- Vou tomar café em casa hoje. E ainda bem que a vacina do meu príncipe pode ser aplicada em outro consultório. Assim que vai ser, pelo menos é o que pretendo.